O que é espionagem digital afinal? O que mudou no mundo da espionagem
desde o episódio do Garganta Profunda, fonte secreta do Washington Post
sobre o escândalo do Watergate e mais recentemente do caso Julian
Assange e do Edward Snowden? E no âmbito empresarial, que vai de casos
como de Madame Coco Chanel à Petrobras?
Tomar conhecimento de uma
informação sigilosa obtida de forma privilegiada seria o conceito básico
de espionagem. Em seguida, surge a relação de interesse sobre a
informação, para quem a mesma possa agregar valor, se tornar um
conhecimento. Por isso que, hoje, a espionagem vem muitas vezes abraçada
com o conceito de vazamento de informação, que significa revelar para
terceiro não autorizado uma informação sigilosa obtida de forma legítima
ou clandestina mas sem a ciência do proprietário da mesma que ela seria
compartilhada com outros ou tornada pública.
Apesar do dano que a
espionagem pode gerar, claro que há casos excepcionais em que os fins
justificam os meios, e que, se não fosse a espionagem, não teria como as
pessoas saberem a verdade dos fatos.
Logo, conforme os manuais
militares, espionar envolve diretamente um serviço de inteligência. Ou
seja, de obtenção de informação. E se proteger contra espionagem envolve
um serviço de contra-inteligência, ou seja, de segurança da informação.
E um não existe sem o outro. Isso mostra que praticamente estamos o
tempo todo na Sociedade do Conhecimento ou espionando ou sendo
espionados. É bem difícil manter uma posição totalmente neutra.
Sendo assim, se espionagem é uma técnica, um modus operandi,
que hoje tem cada vez mais ferramentas tecnológicas para ser executada,
ela representa poder e pode determinar o domínio político ou económico
de uma instituição sobre outra (no caso de espionagem industrial ou
comercial) ou mesmo de um país sobre o outro, podendo chegar a gerar no
último caso a uma guerra digital, que é a guerra dos dados.
Segundo relatório do FBI,
quanto mais conectados estamos, maior a possibilidade de estarmos sendo
espionados eletronicamente, o que é facilitado pela falta de hábito de
segurança digital em um nível endêmico-cultural.
Dito isso,
quando um ato de espionagem entre países seria legítimo? Haveria uma
forma tornar a espionagem legal? Vide os casos recentes envolvendo
Alemanha, China, Estônia, Nova Zelândia, Austrália, Índia, Irã, Iraque,
Rússia, como fica a legislação não apenas de cada país, mas em nível
global?
Vejamos o efeito 11/9 que gerou o Patriot Act nos EUA, em
que a seção 215 dá poder jurídico para a Autoridade Americana usar
qualquer meio que a permita ter acesso ilimitado a uma informação que
possa contribuir com a proteção ou segurança nacional dos EUA. Em outras
palavras, dá carta branca para olhar qualquer tráfego de dados que
possa ser relevante em uma investigação para combate a ameaças à
segurança nacional (que traduzimos hoje em combate ao terrorismo).
O
que isso significa para os demais países, mesmo os aliados? Que foi
feito através do Congresso Americano (legislativo) uma espécie de cheque
em branco que diz que quase tudo que for contra os EUA é terrorismo.
Bem,
em qualquer momento da história humana sempre foi muito perigoso o uso
de institutos como o do flagrante preparado, da interceptação ou mesmo
da tortura, sob a justificativa de se dar maior segurança à
coletividade, se isso não for muito bem acompanhado do devido processo
legal para que não haja arbitrariedade da autoridade nem abuso de poder.
No
entanto, no âmbito público, especialmente entre países, há uma carência
de definição de regras claras, de como será este jogo político
internacional, global, sem fronteiras claras. Afinal, não se espiona
mais o inimigo, mas sim qualquer um, em qualquer lugar, a qualquer
momento, se houver interesse para tanto, ou com o poder do big data, basta haver poder de processamento para tanto.
Hoje,
pode-se apenas varrer internet e as redes sociais para se descobrir
segredos industriais, por exemplo. Muitas vezes isso nem configura ato
de espionagem pois o mesmo presume que a informação tenha que estar
protegida, como não é possível o crime de invasão se a porta estiver
aberta. Se as pessoas publicam tudo e qualquer coisa, inclusive sobre
sua rotina, horário, trajetos, projetos, trabalho e até sobre outras
pessoas, basta alguém estar olhando para descobrir.
Por certo o que mudou foi que acabou o glamour. De uma navegação no Facebook ao uso de um sniffer
para buscar dados em maquina alheia, banalizamos não apenas a
espionagem mas a própria informação. O melhor combate a espionagem hoje
envolve educação em segurança da informação. Claro, faz-se essencial
celebrar um tratado internacional entre os países da arena
política/económica mundial atual para que sejam definidas as novas
regras do jogo. Desde o fim da URSS e queda do muro de Berlim, não
recombinamos o jogo, e agora todo mundo joga contra todo mundo, e caiu
na rede é peixe!